30/08/2010

A arte de escutar o silêncio


“Quem ama 'escuta' no olhar aquilo que os lábios ainda não são capazes de dizer.

Existem situações que experienciamos nas quais parece que ninguém nos entende. Há dores que nos roubam a capacidade de nos expressarmos e, conseqüentemente, de sermos compreendidos naquilo que somos. São realidades nas quais as palavras se ausentam e não somos capazes de “nos dizer” no que pensamos e sentimos. Isso acaba inaugurando em nós um gradativo processo de solidão em virtude de não sermos conhecidos e compreendidos em nossa verdade.

São raras as pessoas que têm sensibilidade para escutar nossos “silêncios”, e paciência para, aos poucos, desvelar o mistério que somos nós.

Expressar-se é uma arte, compreender alguém também o é. Essas virtudes são fruto de muita luta e empenho, e não apenas de habilidade natural.

Penosa e desestruturante é a dor da incompreensão, do sentir-se estrangeiro no próprio território, por sentir algo e perceber que os outros não podem compreender. Dor ainda maior se faz real quando nos descobrimos julgados e encarcerados no que não somos, em conseqüência de não sermos escutados em nossa realidade, expressa em “palavras” que ainda não fomos capazes de dizer.

Pelo fato de não conseguirmos nos comunicar externando o que somos, constantemente, somos mal interpretados e confundidos em inverdades de compreensão, que nos aprisionam e nos ausentam de nossa identidade. Diante disso, acredito que amar é ter a capacidade de descobrir o outro no que ele não diz... Para descobrir alguém assim é preciso gastar tempo, é preciso observá-lo, abrindo mão dos próprios barulhos e agitações para entender a linguagem silenciosa que revela o ser. Quem ama “escuta” no olhar aquilo que os lábios ainda não são capazes de dizer.

São raras, nos tempos atuais, as pessoas que têm paciência para descobrir o outro nos detalhes, para assim poder amá-lo com inteireza. O fato é que, muitas vezes, estamos tão cheios de nós mesmos que mesmo que o outro “grite” não somos capazes de escutá-lo.

Só acompanha o outro – com qualidade – quem se esvazia das próprias razões. Quem entendeu o que é amar percebe que não pode ser o centro de tudo e que precisa dar espaço em sua vida para que o outro seja quem realmente é, revelando-se em seus valores e crenças.

Há muitos que em toda a vida são amados – se é que o são – somente a partir de uma imagem criada a seu respeito e não daquilo que verdadeiramente são. Tal realidade impõe no ser uma profunda crise, estabelecendo a solidão e a inexistência como paradoxo na compreensão do real.

Dizer-se – de maneira compreensível e encarnada – e compreender o outro são necessidades essenciais para que haja harmonia em toda e qualquer relação. Há casamentos, amizades e relacionamentos familiares que se desfiguram pelo fato de ambas as partes não terem a devida simplicidade para decodificarem (traduzirem) sua linguagem, de forma que ambos possam se compreender e ser compreendidos.

O que destrói um relacionamento não é somente a ausência de amor, mas também de boa comunicação. Comunicação que nos transporta para além do comum e nos faz descobrir os segredos que revelam concretamente uma identidade.

Que Jesus, Aquele que, por excelência, tem o dom de traduzir os “símbolos” humanos, nos ensine com a sensibilidade que emana do seu coração a real maneira de compreender e se expressar, desvendando silêncios e inaugurando sempre as novas possibilidades presentes no coração.”

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